A hype da indústria de "healthy foods": o que é verdade e o que é mito

A hype da indústria de "healthy foods": o que é verdade e o que é mito
Por José Henrique Bomfim, Ph.D.*

Com certeza você já ouviu falar das health foods: produtos lactose e glúten free,  alimentos orgânicos ou, até mesmo, comidas "fit". Mas o que a ciência diz desses alimentos? Seriam eles realmente mais benéficos à saúde?

Se você quer saber a resposta para essas e outras perguntas fica com a gente, porque a Overclock vai trazer todos os fatos e mitos para você.

Mas só para adiantar, vamos passar pelos seguintes tópicos:

  • O que são Health Foods
  • Glúten e lactose free
  • Alimentos Orgânicos
  • Comidas Fit
  • Conclusão

O que são Health Foods?

"Pare de comer estes cinco alimentos!", "faça isso e promova longevidade!", "retire estes itens da dieta e emagreça já!"... Enfim, temos certeza de que você já viu isso em uma mídia social, TV, Youtube, ou qualquer outra plataforma. "Produto 100% natural; totalmente sem glúten e lactose". Quando leio isso fico pensando de onde eles acreditam que vem o glúten e a lactose senão da natureza.

Pois bem, essa é uma indústria de bilhões e, geralmente, se rende a modismos passageiros. Dependendo de qual geração você seja, com certeza passou por diversos modismos como sal rosa do Himalaia, cartilagem de tubarão, cogumelo do sol, leite é veneno, óleo de coco.... Se falarmos de dietas então... Atkins, ceto, zero carb, sucos, lua, tipo sanguíneo e por aí vai.

Mas o que realmente há de ciência nestes temas e porque o interesse é sempre tão grande? Porque o tema acaba caindo no gosto principalmente da população mais leiga? Como alguns se aproveitam da carência de conhecimento para vender sua marca e/ou produto?

Vamos lá... O que sempre é o ponto principal é o apelo pelo "natural". Dizeres como "produto 100% natural, sem contra indicações", são extremamente perigosos e quem os utiliza não faz ideia do dano que isso pode ocasionar. 

A natureza é severa e muitas vezes cruel, sempre se protegendo e nada no planeta, nenhuma substância química é livre de algum evento adverso. Lembre-se que urânio, veneno de cascavel, toxina tetânica são totalmente naturais e altamente perigosos. Tudo é questão de bom senso e este tipo de apelo é falso.

Portanto, apelar pela origem natural não é algo diretamente ligado à segurança. Muito do que conseguimos atingir nas últimas décadas vem exatamente da manipulação e tecnologia utilizada para melhorar ou mesmo garantir segurança de um produto.

Mas vamos focar em alguns temas atuais sobre healthy foods e se há evidência das alegações sobre estes.

Produtos Glúten/lactose free

Se você não tem nenhuma das restrições acima, deve ao menos conhecer alguém que evita ou o glúten, ou lactose ou ambos. A alegação? A pessoa afirma que antes destes alimentos serem retirados da dieta, sua vida era um terror, seu intestino estava inflamado, não conseguia emagrecer, mas agora, tudo mudou.

Precisamos entender o que são estes dois compostos e como eles nos afetam.

O glúten é o conjunto das proteínas glutenina e gliadina e está presente no trigo, cevada, malte e centeio. O consumo de glúten pelo homem data de mais de 10.000 anos, com achados de pães de até 15.000 anos, ou seja, história bem antiga de nossa relação.

Entretanto, algumas pessoas podem ter algum grau de intolerância à estas proteínas, como no caso de pessoas com Doença Celíaca, uma condição auto imune causada pela intolerância ao glúten e que reduz a capacidade de absorver nutrientes no organismo ou na sensibilidade não celíaca, caracterizada por distúrbios estomacais.. A não ser por estas condições, não existe nenhum tipo de estudo que evidencie riscos ou prejuízos do consumo de glúten pelo ser humano.

A lactose é o açúcar encontrado no leite de qualquer espécie de mamífero. Para sua digestão em nosso intestino, é necessário que nossos genes expressem a enzima lactase, que quebra o açúcar, a lactose, e permite sua absorção no intestino. Como o leite é normalmente produzido pela fêmea durante o período pós gestacional, pois é o alimento da prole, normalmente reduzimos a síntese da enzima com a idade.

Pessoas com intolerância à lactose poderão desenvolver desconforto gástrico, flatulência e diarreia ao ingerirem leite e derivados. Entretanto, existe todo um movimento em que até mesmo pediatras e obstetras associam diversas condições de saúde dos bebês ao consumo de leite.

Não há na literatura científica nenhum indício que a lactose possa ser a causadora e iniciadora de muitos dos problemas de saúde de quem consome leite e derivados. Se você sente desconforto e má digestão associada ao consumo, basta evitar e nada acontecerá e o mesmo vale para diversos outros nutrientes.

Mas porque este tema é tão difundido e gera crendices equivocadas nas pessoas? Exatamente porque o mercado por trás dos produtos gluten/lactose free se tornou gigantesco e muitos profissionais que tem sua imagem associada à saúde, fitness e afins, são parte deste mercado, muitas vezes tendo ligação comercial com empresas dos seguimentos.

Basta ver que hoje as pessoas já buscam produtos gluten/lactose free quando pensam em comida de verdade. Parece que virou regra dizer que segue uma vida regrada fitness pois está fazendo dieta sem glúten e lactose e essa restrição alimentar chega a ser indicada por leigos para diversas condições, que vão desde doenças auto imunes ao emagrecimento, bastando a pessoa eliminar de vez estes produtos da dieta e tudo estará resolvido...... sim, glúten e lactose tornaram-se os maiores vilões da saúde no geral.

Alimentos orgânicos

A indústria de alimentos orgânicos ganha mais espaço a cada ano, mesmo quando consideramos que os alimentos orgânicos são mais caros do que os convencionais e orgânico não é necessariamente igual a saudável. Por exemplo, o açúcar orgânico ainda é açúcar e sabota os esforços de perda de peso se esse for o seu objetivo.

Este mercado cresceu muito às custas das alegações de que os alimentos cultivados de maneira tradicional são contaminados com toneladas de pesticidas que, além de trazerem danos à saúde, reduzem o sabor e o valor nutricional dos alimentos.

Na verdade, os praguicidas ou pesticidas são utilizados na agricultura e as quantidades destes nos produtos são determinadas pelo governo. É visível que, ao reduzir estes agentes nos cultivos, os alimentos chamados de orgânicos acabam se desenvolvendo menos, pois os insetos, pragas e doenças nos vegetais impedem o desenvolvimento regular destes.

Alimentos orgânicos são livres de pesticidas? Não. Pode haver redução, mas exclusão total não existe. Eles são mais saudáveis para você? Provavelmente não.  Novamente, o mercado que movimenta essas alegações se baseia no conceito do "natural, sem contra indicações" ou "livre de produtos químicos", o que não é real, mas atinge rapidamente nossos cérebros quando buscamos qualidade de vida. O próprio uso do termo "orgânico" é bem apelativo, uma vez que qualquer alimento é orgânico.

Em termos nutricionais, uma cenoura comum será como uma orgânica e, acredite, às vezes mais rica em nutrientes, pois ela não é atacada por pragas que podem utilizar seu metabolismo. Mas, basta colocar a palavra em uma embalagem e a pessoa associa o termo a algo seguro, mais saudável e com certeza pagará valores maiores por isso.


Produtos "Fit""

Talvez esta seja uma das piores alegações dentro do mercado de healthy foods, pois enche aos olhos de quem busca estes produtos visando o emagrecimento ou manutenção do peso.

A palavra "fit" é a abreviação de "fitness" que significa "apto" (que se encaixa). Nada tem a ver com emagrecimento e é muito mais direcionada a quem realiza atividades físicas, como forma de energia ou como algo para se obter nutrientes específicos.

Na grande maioria das vezes, se você buscar os ingredientes na rotulagem, perceberá que estes produtos podem ser mais calóricos que aqueles "não fit". Mas as embalagens, com sua arte gráfica apelando para o saudável ou movimento, garantem atrativos para quem busca algo para poder consumir sem culpa.

Linhas inteiras são lançadas com este apelo de que os produtos são mais saudáveis e que podem ser excelentes substitutos para o público que pretende mudar hábitos de vida. Se você busca produtos com este tipo de objetivo, talvez a melhor opção seja fugir daqueles que são diferenciais ultraprocessados.

Conclusão

Por fim, poderíamos escrever páginas e mais páginas com os diversos modismos e produtos que buscam o consumidor que quer uma vida mais saudável, onde alguns realmente tem um impacto na saúde do indivíduo, mas a grande maioria logo sairá do mercado.


Busque excelentes fontes alimentares e mudança de hábitos. Isso sim trará uma mudança visível (e claro, se você tem restrições, não coma!).



 Referências Bibliográficas:

 

SOLER C et al. Gluten-Free Products: Do We Need to Update Our Knowledge? 2022 Nov 28;11(23):3839.

FACIONI M et al. Nutritional management of lactose intolerance: the importance of diet and food labelling. J Transl Med. 2020 Jun 26;18(1):260

 STAJER V et al. Let's (Tik) Talk About Fitness Trends. Front Public Health. 2022; 10.

*José Henrique Bomfim é Farmacêutico Bioquímico, mestre em toxicologia, doutor em farmacologia clínica e consultor científico da Overclock


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