Todos nós tivemos experiências diferentes com games ao longo da infância e adolescência, seja por gosto pessoal, condição financeira, acessibilidade a lan houses ou até mesmo rotina da escola. A nossa família, de certa forma, pode ser considerada como o aspecto mais determinante na nossa vida de gamer, podendo ela ser o motivo por qual jogamos até hoje, ou o fator que nos fez largar de vez os jogos, dependendo de como nossos pais ou responsáveis os viam: às vezes, um passatempo inofensivo, outras vezes, uma perda de tempo ou uma influência negativa na vida de uma criança.
Eu, por exemplo, tive diversas fases com os jogos eletrônicos durante minha infância. Carrego muitas lembranças de jogar o Microsoft Combat Flight Simulator II (200) com ajuda do meu pai no nosso velho Windows XP, sentado no colo dele, pois não tinha altura para alcançar o PC e nem a coordenação com as mãos para manusear o joystick que ele me dera de aniversário de 5 anos. O nosso passatempo favorito, após o expediente do meu velho e a minha escolinha de futebol, era passar a tarde fazendo as missões da campanha do jogo, até a hora da janta.
Apesar de tentarmos muito, minha mãe e irmã nunca aderiram muito à nossa rotina. “A tela colorida me dá muita dor de cabeça”, dizia minha mãe enquanto assistia os 2 garotos na sala se acabando nas risadas quando errávamos o pouso, ou quando, na maioria das vezes propositalmente, colidimos com outro avião em pleno voo, apenas para nos maravilharmos com as cutscenes de explosão em pleno ar.
Com o passar do tempo e a mudança de rotinas, os momentos em que meu pai e eu sentávamos no pc para jogar juntos foram diminuindo, uma vez que a escola passava a ser integral e, meu pai, com a mudança de emprego, voltava pra casa apenas na hora do jantar. Nas férias sempre havia um esforço para manter a tradição, como, por exemplo, em 2010, quando ganhei de Natal um notebook e duas cópias de Age of Empires II.
Grande parte das minhas memórias no Fundamental II foram também no escritório de casa, onde nossas partidas 1x1 no jogo duravam, muitas vezes, até depois da minha hora de dormir. “Não se preocupe meu bem, o garoto está aprendendo a ser um general de guerra e líder de uma nação, como isso seria ruim para uma criança?”, dizia meu pai, com um sorriso irônico no rosto, ao ser confrontado pela minha mãe sobre o meu horário de sono nos dias que jogávamos, carinhosamente apelidados de “dia de farra”.
A relação dos meus pais com os jogos sofreu uma mudança com a chegada dos primeiros consoles em casa. No meu aniversário de 13 anos, fui presenteado com um Xbox 360, o primeiro console que realmente causou um grande impacto na minha vida e me aproximou drasticamente do mundo dos games. Houveram limitações de horários para os jogos, uma vez que eu queria jogar sempre que possível – um clássico caso de adolescente passando mais horas que deveria na tela –, além de restrições para títulos mais violentos, como Call of Duty e Mortal Kombat.
Essa foi a época “sombria” dos jogos em casa. Tal qual a criança mimada que eu sempre fui, rolavam várias reclamações sobre as restrições que foram impostas durante o meu Ensino Fundamental e Médio, nas quais até mesmo propostas de jogar profissionalmente Halo foram recusadas por meus pais, que viam o mundo dos games apenas como um passatempo bobo, não uma oportunidade de carreira. Hoje em dia, olhando para o passado, eu até concordo em partes com os limites que meus pais colocaram, pois, sem eles, eu realmente não faria nada além de jogar videogame o dia todo, algo divertido, porém, pouco proveitoso para uma criança nessa idade.
Muitas pessoas podem se relacionar com a minha história nos jogos, tendo elas memórias carinhosas com os videogames ao lado dos pais ou responsáveis, ou até mesmo lembranças um pouco rancorosas com os limites impostos pelos mesmos na hora da jogatina, mas uma coisa é inegável: os pais – muitas vezes o pai, como no meu caso – possuem enorme influência na vivência e gosto por jogos que carregamos até hoje. Eu, por exemplo, desenvolvi um gosto enorme por simuladores e jogos RTS (Real Time Strategy), como Starcraft e Halo Wars, títulos dos quais até hoje consigo conversar com o meu pai sobre e, se eu tiver sorte, passar algumas horas de feriados ou fins de semana ao lado dele, jogando juntos ou apenas assistindo.
Uma das melhores histórias da influência de familiares na vida gamer foi compartilhada por um membro da nossa equipe de Marketing, Alexandre Alvino. Alê desde o começo da sua vida se viu rodeado de computadores e jogos, com diversos membros da família e amigos inseridos no mesmo mundo que ele. Ele vem de uma família genuinamente gamer, e através da avó e do seu pai, conta uma história de amor por jogos que atravessa gerações.
Ele foi inserido nos games da maneira mais raíz possível. Introduzido pelo seu pai no mundo dos jogos, Alê conta que logo cedo, aos 6 anos, frequentava a lan house da sua cidade com o seu velho, onde conheceu o CS 1.6, que logo virou uma das paixões do menino nos seus anos de infância. “Eu tinha uns 6 anos e ele me apresentou o 1.6. Eu era muito vidrado nesse jogo, especialmente os mapas fy_pool_day e fy_iceworld, mapas que quem jogou certamente conhece. Além disso, como era em lan, aquele ambiente rodeado de pessoas, era uma sensação muito legal estar com aquele pessoal naquele momento”.
Além da lan, Alex, pai de Alexandre e gamer ávido, costumava levar os filhos aos Arcades da cidade em que morava e, foram nesses ambientes que o filho diz ter suas melhores memórias da sua infância relacionada a videogames. “A melhor memória que eu tenho com meu pai quando a gente jogava foi num fliperama, jogando 1942, um jogo Arcade de aviãozinho no estilo clássico de Space Invader, e eu lembro que foi muito incrível”. Hoje um gamer de carteirinha, o jovem é um dos poucos gamers da sua idade (18) que viveu na pele os tempos de ouro de lan no Brasil a conviver com os primeiros títulos de séries clássicas como Street Fighter.
Um gamer de respeito por si só, Alex conta que viveu as diferentes fases dos consoles antigos ao longo da sua vida: “Tenho 42 anos, sou técnico de informática e gamer desde sempre, pegando as épocas do Atari, Master System, Mega Drive, Super Nintendo, Play e tudo que vocês imaginarem. Agora, se falando em computadores, eu trabalho vendendo PC gamers”.
Apesar de jogar até hoje, cultivando o seu amor aos games desde os tempos de criança, Alex diz ser um gamer mais arcaico, preferindo os títulos mais antigos “pela diversão”. Os arcades e jogos de fliperama são os seus preferidos, como Golden Axe e Sunset Rider, argumentando que existe uma forte conexão entre eles e a sua geração dos anos 80, a década em que os fliperamas se popularizaram pelo Brasil.
Sempre inserido no mundo dos PCs e das tecnologias por causa da sua profissão, Alex incentivou os filhos a desenvolverem a mesma paixão que o pai pelos jogos, provendo acesso a computadores e internet desde que era possível. Hoje, com uma filha mais nova de 6 anos, a família regularmente joga todos juntos, tal como um clássico almoço de domingo. Ele até comenta com (risos de fundo) sobre a vez em que, ao jogarem um game de Kinect, a mãe de Alê quebrou o dedo do pé chutando o sofá.
O pai tem bastante a agradecer à avó, Dona Elça, que também proporcionou um ambiente lotado de games para seus filhos e netos. A senhora de 66 anos conta que o seu irmão foi o responsável pelo início da cultura de games, que a família carrega até hoje, quando ele trouxe pra casa um “Nintendinho” (nome popular do NES, ou Nintendo Entertainment System), além de outros consoles que logo ficaram populares entre os filhos da Dona.
A senhora, que já possuía uma loja de jogos, onde negocia cartuchos, consoles e tudo relacionado aos games da época, teve a ideia de abrir uma lan house depois de ver o movimento que os consoles do seu irmão traziam para a casa da família. Com isso, a relação entre a família Alvino e o mundo dos games finalmente se consolidou, sendo a lan house o palco para a jogatina da própria avó, seus filhos e netos. Mesmo com a lan house fechada há mais de 10 anos, Dona Elça é apaixonada por jogos onlines, e ainda se diverte especialmente com MIR4 e MU Online – sim, todos nós ficamos surpresos com a vovó dos MMORPGs.
Um ponto em comum quando falamos com os três entrevistados (avó, pai e filho) foi a união que os videogames trouxeram à família, algo pouco comum até mesmo hoje. Enquanto o Nintendinho era a diversão da casa no tempo da avó, a lan house e os consoles cativaram os filhos e netos a aderirem esse amor carregado pelos mais velhos e, se tivermos sorte, retratarmos no futuro como a próxima geração dos Alvino continuam carregando a herança cultural que o tio Jhonny introduziu que, talvez sem nenhuma intenção, com certeza moldou as relações e criou memórias que todos da família guardam no peito.
Texto por Rodrigo Melo
Jorge Andrade
Que texto emocionante ! Muito bom mesmo!