São Paulo, 24 de novembro de 2020 – Desde março deste ano, a pelada do final de semana, os encontros de happy hour, o convívio nos espaços esportivos, educacionais ou trabalho foram suspendidos. Os entusiastas do esporte – do praticantes até os espectadores – sentiram o baque com o vácuo de eventos; as confraternizações, reuniões e palestras passaram para o ambiente virtual na busca quase que desesperada para reconstituir as relações mantidas no dia-a-dia presencial.
Nesse contexto, as salas do Discord começaram a se encher com players: se antes a socialização dos jovens se dava nos bares, agora muitos se reúnem na plataforma onde conversam em paralelo aos jogos online, como é o caso de CS:GO e Among Us. São esses lobbies que passaram a permitir interação, senso de equipe e pertencimento.
No âmbito dos espectadores, as plataformas de streaming ganharam força, como é o caso da Twitch. Tendo o streamer “Gaules” como referência brasileira, o ex jogador profissional de CS:GO atingiu o recorde de 90 milhões de horas assistidas entre os meses de janeiro e setembro de 2020. A grande parcela da audiência foi atraída pela transmissão de campeonatos oficiais de CS:GO por Gaules, em um contexto de recessão dos grandes eventos presenciais que eram realizados antes da pandemia.
É aqui que temos o outro lado da moeda: a quarentena não significou redução de público ou de eventos que seriam realizados pelos organizadores de grandes eventos do eSports, mas impactou negativamente na jogabilidade dos amadores e profissionais. No caso do Brasil, que ainda depende da importação tanto de periféricos como peças para montagem de PC’s, o alto valor do dólar prejudicou parcelas desse mercado que depende fundamentalmente da importação. Mas por outro lado, empresas nacionais obtiveram crescimento, como é o caso da Overclock, que produz uma bebida para o público gamer, que ajuda na concentração e performance durante os jogos.
Nos eventos presenciais, existe uma condição de igualdade entre os jogadores: os computadores são os mesmos, assim como a conexão de internet e outros fatores decisivos para um bom jogo. No caso das partidas realizadas em “home office” – ou seja, cada um em sua casa, com seu próprio computador – dificuldades que antes não existiam começaram a aparecer.
Temos aqui dois exemplos de casos que ocorreram com times brasileiros. O primeiro é a suspeita de cheating que se levantou em uma partida do MiBR contra Chaos, no jogo realizado em junho pela cs_summit 6. Algumas jogadas de players da Chaos foram consideradas “estranhas” e “suspeitas” por pro-players e influenciadores do meio. A condição dos jogadores estarem em casa propicia que casos como esse aconteçam, pela falta de uma fiscalização adequada tanto pela plataforma como pelos organizadores do evento.
O segundo caso são as desigualdades que atingem indiretamente cada um dos times, a depender da localização dos servidores. Por exemplo, a plataforma FaceIt, utilizada em algumas competições oficiais de CS:GO, possui servidores em 3 cidades norte-americanas (Dallas, Chicago e Denver): a depender do servidor escolhido pela organização e da localização dos respectivos times, pode haver uma grande diferença de ping, o que prejudicaria a jogabilidade. Nos grandes eventos presenciais, problemas técnicos como esse seriam minimizados, uma vez que os jogadores estariam no mesmo lugar, à mesma distância do servidor.
Em resumo, a quarentena mundial trouxe prejuízos e dificuldade de adaptação em alguns aspectos do eSports profissional. Mas por outro lado, trouxe aumento de credibilidade do eSports como um esporte. Jogos Universitários tiveram como modalidade única em 2020 o eSports, reunindo torcidas que antes ficavam em arquibancadas, e hoje torcem pelo chat da Twitch. No vácuo deixado pela falta de jogos de futebol transmitidos nas emissoras convencionais, muitos jovens migraram para o streaming, favorecendo o boom de streamers como o Gaules. Consequentemente, essa popularidade acarreta movimentação do mercado nacional de produtos voltados aos gamers, assim como dos desenvolvedores brasileiros de games.